sábado, 8 de agosto de 2009

Acreditar.

Na época da criação, a Terra se rendeu aos encantos de uma feiticeira e pediu que ela visse seu futuro.
- O que você vê aí? – perguntou a Terra à feiticeira.
- Oh, eu vejo muitas coisas... Muitas coisas!
- Coisas boas, feiticeira?
- Boas, Terra? Boas e ruins, como tudo na vida.
- Ora, diga a verdade! Não gostou da criação?
- Imagina! Quem sou eu para julgar a criação de terceiros. Logo eu que nunca criei nada! Quis dizer que se você espera só coisas boas, é melhor que eu não diga o que vejo.
- Mas é tão ruim assim?
- Já disse: tem seu lado bom e seu lado ruim. Queres saber qual parte primeiro?
- Tanto faz.
- Escolha logo que não tenho o dia todo! Marte tem hora marcada comigo.
- Tudo bem, conte-me a parte boa. Deixe os problemas para mais tarde! Que acabei de ser criada e tenho sono.
- Certo... – diz-lhe a feiticeira com certo receio – Suas paisagens são as mais lindas que já vi na vida. Em todo o universo não se encontra o sol no lugar e tempo perfeitos, só dentro de você. As praias! Meu deus, as praias! São a imagem do paraíso, em cada centímetro.
- Bom – disse-lhe a Terra embevecida – Não imagino o que pode haver de ruim no meu futuro. Vê o que espera os meus habitantes? Um lugar maravilhoso!
- Sim, minha cara. Mas e o que esse lugar maravilhoso pode esperar de seus habitantes? –perguntou-lhe a sempre sábia feiticeira.
- O que você está insinuando?
- Não insinuo, Terra. Só repasso o que vejo em seu futuro.
- Ah, é? – disse-lhe a Terra em tom de desafio. – E o que estás vendo de tão ruim em meu futuro?
- Estou vendo seres a quem deste inteligência não saberem aproveitar o belo cenário que os cerca. Eles farão queimadas, desmatamentos, confundirão o clima do planeta, criarão indústrias que deixam o céu cinza, declararão guerras em nome de deus para lucrar sobre a morte de outros.
- Não, isso não pode ser verdade! – a Terra arregalou os olhos – Eles não fariam isso comigo! Não se trata assim sua terra-mãe! É desumano!
- Pois, a humanidade é desumana.
- Não acredito, feiticeira. Não quero acreditar.
- Não quer acreditar? Não faça isso, Terra. Ainda há solução. Se acreditarmos. Temos que admitir os problemas que existem e buscar uma solução. E acredite: sempre há solução. Desde que acreditemos. Entendeu?
- Acho que entendi, mas... Acreditar em quem?
- Acreditar nos homens, Terra – disse-lhe a feiticeira pacientemente.
- Nos homens? Mas logo eles que vão acabar por gerar tanto problema e devastação?
- Terra! Não os julgue! Eles não sabem!
- E se souberem não farão?
- Não. O que lhe disse já foi escrito. Mas não por todos os homens. Há sim, homens devastando, mas há gente reconstruindo, ajudando, recuperando. Temos que seguir acreditando, Terra. Quando os homens se derem conta de que acreditamos neles, talvez eles acreditem em si próprios também. E todos os problemas terão solução.
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Eu sei que não faz muito sentido uma feiticeira falar com um planeta antes mesmo da criação do ser humano. Mas a idéia é justamente pensar nas feiticeiras como algo que vai além do ser humano. Até por que... Feiticeiras vão além do ser humano.
Texto para o Once Upon a Time.

Um comentário:

Liv disse...

Feiticeiras vão além do ser-humano [+1].
Gostei desse texto, principalmente da última fala da feiticeira. Muito bom!

Beijos.