domingo, 4 de outubro de 2009

O gato.

Cinza, como de costume. Assim eram todos os dias naquele algum lugar em meio ao frenético mundo adulto.
De dois em dois segundos alguém dava uma olhadela disfarçada no relógio de pulso e confirmava pela milésima vez que já era tarde.
Ouvia-se um murmúrio quase silencioso, mas ninguém se preocupou em saber o que era dito.
Caso se preocupassem, descobririam um pequeno menino perdido em meio àquele frisson de segunda feira na hora do rush.
Ele cantarolava uma música qualquer, bem baixinho, sem querer perturbar.
De repente, a mulher bem vestida e com postura de quem é casada com gente importante sentiu um puxão na sua saia.
Notou instantaneamente que o murmúrio cessara, e ao olhar para baixo avistou um pequeno menino de olhar doce.
A mulher manteve a pose de bem casada e olhou fixamente para o menino esperando que ele dissesse o que queria. Mas o menino nada disse e apontou para os trilhos do metrô.
A tal mulher seguiu com o olhar a direção para a qual apontava o menino e a primeira vista, não entendeu. Em poucos segundos decidiu que o menino merecia um olhar mais atencioso e só então viu: havia um gato, quietinho, procurando se aquecer nos trilhos do trem.
Era um gato muito pequeno, e imóvel de tal forma que parecia até mentira. Mas havia um brilho inexplicável nos olhos do gato que a fizeram ter certeza de que ele era de verdade.
A mulher se voltou ao menino para dizer que tiraria o gato dali, mas o menino já se fora. Não havia mais murmúrio, não havia mais puxão na saia, havia o frisson de segunda-feira e nada mais.
A mulher pensou em perguntar sobre o menino aos homens de paletó ao seu lado, mas em seus olhos não havia brilho. Em seus corpos não parecia haver vida, de forma que a mulher chegou a pensar que estavam todos mortos. Mas seus movimentos maquinais de olhar o relógio a cada dois segundos a faziam ter certeza de que eram humanos de verdade.
De um súbito ouviu o barulho inconfundível do trem se aproximando. A mulher olhou para o trem passando e deixou uma lágrima borrar-lhe a maquiagem.
Houve um blackout no metrô e via-se um borrão branco se esvaindo dos trilhos do trem. Formava-se, na frente da mulher, a imagem de um pequeno menino de olhar agora nostálgico, e ouvia-se uma música qualquer cantarolada numa voz triste de criança.

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Me senti mal ao escrever esse conto. A inspiração veio quando eu estava esperando o metrô pra ir à aula de canto. Sabe aquelas idéias que vem num fôlego só? Dessa vez foi assim.
Fiquei sinceramente feliz com o resultado que teve o último post (Anjo da Morte). Surpresa, e muito feliz.
Espero me sentir mais vezes assim durante a vida.

8 comentários:

Jesus disse...

Oie, gostei muito do texto, tirando o fato de terem deixado o gatinho nos trilhos, custava alguém mais se importar com ele?...bom você quem deixou comentar ^^
Beijos

Yas B. disse...

Muito bom o conto, de primeira categoria, coitado do gato, mas sem ele não teria a mesma coisa, sem sem sacrifício. Adorei.
:)

http://yas.carly.zip.net/

Babi Farias disse...

Nossa... Cê some, mas quando volta, é inspirada, hein?!
Adorei!
;*

Liv disse...

Adorei o post. Fiquei com uma pena do gato, mas ficou muito lindo o texto!
Beijos.

Sabrina Montovanelli disse...

Gostei do texto e principalmente da mensagem que ele passa, pois é uma coisa que acontece frequentemente, as pessoas estarem tão preocupadas com sua própria vida que não vêem o problema dos outros.

Unknown disse...

Eu gostei da história, mas não entendi a relação do menino com o gatinho...

Beijos

Babi Farias disse...

Selinho pra ti lá em meu blog!
;*

Elisa Mucida disse...

Ei Lu,
faz um tempo que não venho aqui. O seu blog tá com uma cara liiiiiinda de viveer. E eu amei o texto. A inspiração vem quando a gente menos espera né? Owwwn, coitado do gatinho. USHAHSA

Muito bom mesmo, beeeijos.